Na vitória ou na derrota, com ou sem o título brasileiro, Felipe estará nas nuvens após o jogo com o Flamengo. Quatro horas depois, feliz ou arrasado, ele voará para os Estados Unidos com a mulher, Carla, e os filhos Lucas, 6 anos, e Thiago, 2. Na melhor das hipóteses, Felipe perderá a festa do título. Na pior, vai chorar no ombro do Mickey, no fantástico mundo da Disney.
A entrevista ao Jogo Extra foi também uma viagem. No tempo. Felipe lembrou, por exemplo, seu último jogo pelo Flamengo, em 2004, quando marcou um golaço na vitória de 6 a 2 sobre o Cruzeiro, e arremessou o manto sagrado para um voo polêmico. Felipe viaja também para o futuro. O jogador mais vitorioso da história do Vasco quer mais e, mesmo que o título não venha, ele já se realiza:
— Sinto orgulho desse time — afirma.
Sofreu com a eliminação da Sul-Americana?
Apaguei. Quando acordei, estava 1 a 0. Dormi mais, vi o Fagner sendo expulso e eles fizeram mais um. Aí, desliguei.
O que fará nas férias?
Vou passar 11 dias na Disney com a família. Será minha primeira vez. Viajo depois do jogo. Do Engenhão, sigo para o aeroporto.
Vai ficar fora da festa?
O importante é o título.
Esperava essa boa fase?
Fiquei cinco anos fora e fico feliz por me sentir útil. Não passa pela minha cabeça parar. Tem muita gente na minha frente: Deco, Juninho (risos)... Tenho 34 anos e mais um de contrato.
Mesmo com contrato em vigor, recebe sondagens?
Nada oficial. Para me tirar do Vasco, será muito difícil. A princípio, pretendo cumprir o contrato, renová-lo e parar um dia, jogando pelo Vasco. Não pretendo sair mais. Tenho identificação e história.
Você é o jogador mais vitorioso do Vasco, mas a relação era ruim. O que mudou?
Cheguei em 1983, com 6 anos. Melhorei, estou mais maduro. O Vasco também melhorou. A estrutura vem melhorando cada vez mais. Acredita que fui campeão brasileiro ganhando R$ 2 mil de salário, em 1997? Eu vivia duro (risos).
Foi um erro ter passado pelo Flamengo?
Não. Sou profissional.
Eu trouxe um vídeo pra você ver...
Eu já até sei o que é. É o meu gol, contra o Cruzeiro? É aquele que eu comemorei jogando a camisa do Flamengo para o alto?
Sim. Por que fez aquilo?
(Olhado o vídeo) Esse não foi um gol normal. Tá maluca? Foi o gol mais bonito da minha carreira. E já é difícil eu fazer gol. Foi uma maneira de extravasar. Joguei a camisa para o alto, mas camisa não voa. Camisa cai. Quem gosta de mim interpreta de um jeito. E quem não gosta interpreta de outro. Jogar a camisa no chão e pisar é uma coisa. Foi um golaço, na última rodada. Livramos o Flamengo do rebaixamento. Eu era um dos principais jogadores e, se o Flamengo fosse rebaixado, ia cair nas minhas costas, e também nas do Júlio César e do Zinho. O Ibson ainda era garoto. Eu ia entrar para o lado negro da história do futebol. Foi um alívio.
Comenta-se que na véspera do jogo você discutiu com o Júlio César e o preparador físico Marcelo Salles, filho do lateral-esquerdo Marco Antônio, campeão do mundo em 1970. Eles teriam dito que o Marco Antônio jogou muito mais do que você...
Misturaram as histórias!!! Eu e o Júlio César ficávamos botando pilha. Não vi o Marco Antônio jogar, mas dizia: "pô, teu pai foi do Vasco mas não jogava nada". Não houve briga. Marcelo é meu parceiro.
Com raízes vascaínas, foi difícil vestir a camisa do Fla?
Meu pai prefere que eu jogue no Vasco, mas não tenho dúvida de que torceu pelo meu sucesso. Voltei da Turquia e o Flamengo procurou meu empresário. O Vasco não procurou. Ia fazer o quê? Deixar de trabalhar? Honrei a camisa de todos os clubes que defendi. Se foi bom ou ruim, cada um que tire sua conclusão. Tenho a consciência de que onde fui, dei o melhor.
Você é Vasco?
Sou.
A Libertadores do ano que vem é uma motivação?
Já conquistei uma. É diferente. Os times sul-americanos fazem catimba e evoluíram muito.
A perda de dois mundiais está engasgada?
Bati duas vezes na trave. Contra o Real Madrid, fomos superiores. Contra o Corinthians, as duas equipes eram de alto nível.
Luxemburgo foi quem pela primeira vez convocou você para a seleção, em 1998. Ele tem um significado especial?
Foi o primeiro que me convocou e foi quem me botou também no meio-campo. Ele enxerga onde um jogador pode ser útil, uma leitura rara entre treinadores. Foi um dos melhores técnicos que tive. A partir dali, mudei para o meio. O (Antônio) Lopes, meu técnico no Vasco, gostou.
Algum palpite para essa última rodada?
Para chutar, vou ter que dar um palpite favorável também para o Palmeiras, né (risos)? É difícil, mas, não, impossível. É complicado depender dos outros.
É muito ruim perder para o Flamengo?
Sem dúvida. Assim como para eles também é ruim perder para o Vasco. Qualquer vascaíno prefere perder para o Botafogo ou o Fluminense. Os rubro-negros também. Vivi isso nos dois lados.
A síndrome de vice, motivo de provocação, incomoda?
Não. Só é vice quem chega à final. E os que nem isso conseguem? Dizem que ser vice é o mesmo que ser o último. É a nossa cultura, infelizmente. Mas é melhor chegar à final com chance de ser campeão do que estar em último, sem esperança. Se houver festa no Rio, será do Vasco.
O Vasco é motivo de orgulho para você?
Sempre foi e sempre vai ser. Tenho orgulho do nosso grupo, pelo que a gente fez o ano todo. Espero que todos fiquem para a próxima temporada e que venham reforços. Talvez, o Vasco nem seja o grande time do Campeonato, mas tem o melhor grupo. Não há vaidade. Já fiz parte de grupos mais qualificados, mas sem essa parceria. Em 97, havia divergências. O time vencia pela qualidade técnica.
De onde vem essa união?
Vem do treinador. Ricardo e Cristóvão ganharam o grupo pela simplicidade. Um jogador não faz questão de aparecer mais do que o outro.
O Engenhão ficará pequeno, neste domingo, às 17h. Num clima de final, Vasco e Flamengo podem decidir o Campeonato Brasileiro, mas somente os vascaínos têm a oportunidade de sair com o grito de campeão. Para conquistar o penta, é preciso vencer e torcer por derrota do Corinthians para o Palmeiras. Aos rubro-negros resta tentar a vaga na Libertadores e, de quebra, atrapalhar a festa do rival.
Nesse clássico que pode entrar para a história, os goleiros não são as principais estrelas, mas tiveram participação especial na temporada. Tido por muitos como o melhor do Flamengo este ano, Felipe foi o herói da final do Estadual contra o Vasco na decisão por pênaltis e o melhor em campo no 0 a 0 do primeiro turno. Já Fernando Prass era o capitão na conquista da Copa do Brasil e ainda vai bater um recorde pessoal.
O camisa 1 vascaíno, além de poder ganhar mais um título, alcançará a marca de 133 partidas seguidas, igualando-se a Rogério Ceni. O recorde é de Wladimir, do Corinthians, 161. Além disso, Prass é o único da Série A a ter participado de todas as partidas de seu clube no ano.
Ao fim de uma maratona de 75 jogos, quatro competições e o título da Copa do Brasil, o goleiro espera levantar mais uma taça, dois anos depois de chegar a um clube que vivia o seu pior momento e ajudá-lo a se reerguer como titular da campanha da Série B e dono da camisa 1 desde então.
“Com um ou outro percalço, posso dizer que levei bem. Esse foi um dos melhores anos da minha carreira. Quando cheguei, também foi muito bom, porque ninguém me conhecia”, disse Prass, na expectativa de comemorar mais uma vez. “Uma vitória nos dá o título e tira o Flamengo da Libertadores. Mas não fico secando. Só me preocupo com o Vasco”.
Entre os dois, só Felipe pode interferir diretamente na situação de seu clube. Se não levar gol, no mínimo garante o empate que classificará o Flamengo para a Libertadores e dará o vice ao Vasco. Uma ótima forma de fechar o ano após chegar sob forte desconfiança pela fama de indisciplinado e terminar como unanimidade e uma das prioridades para renovar o contrato, que termina em dezembro.
“Eu soube aproveitar o momento. Fomos campeões cariocas invictos, com muitas disputas de pênaltis. Foi um ano muito bom. Espero continuar assim por muito tempo”, disse Felipe, que já está identificado com os rubro-negros. “Queremos o Flamengo na Libertadores. A torcida ficará feliz e ainda poderá brincar com a perda do título do Vasco”. [O Dia. Reportagem de Hugo Perruso e Sabrina Grimberg]
ESCALAÇÕES
Vasco: o técnico Cristóvão Borges mais uma vez não confirmou a escalação para o clássico. No entanto, afirmou que vai voltar a relacionar Eduardo Costa para o jogo, já que o volante está recuperado de uma lesão muscular. Outro que volta é Felipe, poupado da partida contra o Universidad de Chile, pela Copa Sul-Americana. O Vasco deve entrar em campo com Fernando Prass, Fagner, Dedé, Renato Silva e Jumar; Nilton (Bernardo), Rômulo, Fellipe Bastos e Felipe; Diego Souza e Alecsandro.
Flamengo: na sexta-feira, Vanderlei Luxemburgo fechou o treino por uma hora e meia para armar o time que vai jogar o clássico. Durante o trabalho, fez algumas experiências. Num primeiro momento, Fierro foi titular no meio-campo. Depois, entrou Muralha. Na frente, Deivid voltou a figurar na equipe de cima. O lateral-esquerdo Junior Cesar retorna após cumprir suspensão contra o Inter. O time provável: Felipe, Léo Moura, Alex Silva, Welinton e Junior Cesar; Willians, Fierro, Renato e Thiago Neves; Ronaldinho e Deivid.
QUEM ESTÁ FORA
Vasco: Allan e Juninho Pernambucano cumprem suspensão pelo terceiro cartão amarelo. O atacante Leandro foi expulso na última rodada e também não será relacionado. Eder Luis, machucado, volta apenas em 2012.
Flamengo: os volantes Airton e Maldonado não vão jogar. O primeiro ainda não está 100% recuperado de um edema no tornozelo esquerdo, enquanto o chileno realiza um trabalho de reforço muscular. Ronaldo Angelim, que se despede do clube, também está fora por conta de uma lesão muscular na coxa direita. Darío Bottinelli e Luiz Antonio só voltam em 2012. O argentino fez uma cirurgia no pé esquerdo, e o volante passou por cirurgias nos ombros.
ARBITRAGEM
Péricles Bassols Cortez (RJ) apita a partida, auxiliado por Rodrigo Pereira Joia (Fifa/RJ) e Ediney Guerreiro Mascarenhas (RJ). Ao todo, Bassols participou de 12 jogos, aplicou 66 cartões amarelos (média de 5,5) e 11 vermelhos (média de 0,9), marcou 443 faltas (média de 36,9) e três pênaltis no Campeonato Brasileiro, que registra média de 5,2 amarelos, 0,3 vermelho e 35,7 faltas. Destes amarelos, 34 foram para mandantes e 32 para visitantes. Ele apitou dois jogos do Rubro-Negro e um do Gigante da Colina: Flamengo 0 x 0 Vasco, pela 19ª rodada, e Botafogo 1 x 1 Flamengo, pela 24ª.
FIQUE DE OLHO
Vasco: considerado o maestro do Vasco, Felipe será uma das principais vias de acesso ao ataque. Calejado em clássicos, quer brilhar justamente no mais decisivo. A habilidade e a visão de jogo do meia, único armador do time, são trunfos do vice-líder para vencer o Flamengo.
Flamengo: depois de encerrar um jejum de pouco mais de dois meses sem gol, Ronaldinho Gaúcho terá a última chance de marcar em um clássico neste ano. Na temporada, foram oito jogos contra rivais cariocas e nada de bola na rede. O craque também deve uma atuação decisiva num confronto deste tipo. É possível que esta seja a última partida dele pelo clube. O atraso da maior parte do salário pode encurtar a passagem do camisa 10. O Flamengo ainda não chegou a um acordo com a Traffic, responsável pelo pagamento.
O QUE ELES DISSERAM
Cristóvão Borges, técnico do Vasco: “Se houver um resultado que beneficie o Vasco, ele vai depender da nossa vitória. Por isso, não adianta termos uma outra preocupação que não seja o Flamengo. Nossa parte é ganhar o jogo. Todo o nosso pensamento estará voltado para o clássico.”
Léo Moura, lateral-direito do Flamengo: “Por ser um clássico, já é um jogo especial. A disputa do título e da vaga na Libertadores mexe ainda mais com o público. Em seis anos aqui, não me recordo de ter perdido alguma partida de final, ou decisão, como esta. Tenho um bom retrospecto e espero continuar assim”.
NÚMEROS E CURIOSIDADES
* Vasco e Flamengo fazem o confronto das equipes que menos perderam neste Brasileirão. As duas equipes sofreram apenas sete derrotas em 37 jogos. Das sete derrotas do Fla, no entanto, seis foram neste segundo turno. Já o Vasco perdeu apenas três vezes no returno.
* Quatro vezes campeão brasileiro, o Vasco pode dar ao Rio de Janeiro seu 14º título na história do Campeonato Brasileiro. São Paulo tem a hegemonia, com 17 títulos. Neste caso, será apenas a segunda vez na competição que o futebol carioca conquista o título por três anos consecutivos.
* O Flamengo não perde para o Vasco há 32 meses (ou sete jogos). A última vitória vascaína aconteceu dia 22 de março de 2009, pelo Campeonato Carioca: Vasco 2 x 0, gols de Elton e Jéferson.
* O maior público registrado em uma partida entre Flamengo e Vasco na história do Campeonato Brasileiro aconteceu no dia 08 de maio de 1983, quando 121.353 torcedores pagaram para ver a segunda partida das quartas de final. O jogo terminou empatado por 1 a 1, gols de Elói, para o Vasco, e Zico, para o Fla, resultado que classificou o Flamengo para as semifinais da competição.
ÚLTIMO CONFRONTO
O último clássico entre Vasco e Flamengo, pela 19ª rodada do Brasileirão, terminou sem vencedor. No dia 28 de agosto, os rivais empataram em 0 a 0 no Engenhão. O Vasco jogou melhor e, com um a mais desde o fim do primeiro tempo, quando Welinton foi expulso, pressionou, mas não conseguiu abrir o placar. O jogo foi movimentado e teve um lance polêmico. Nos minutos finais, Léo Moura derrubou Bernardo na área em pênalti não anotado por Péricles Bassols, mesmo juiz deste domingo. No entanto, o personagem da partida foi Ricardo Gomes, que sofreu um AVC à beira do gramado e precisou ser retirado de ambulância no decorrer da partida. O treinador está em reta final de recuperação. [globoesporte.com]